quinta-feira, 23 de julho de 2009

COMISSÃO ESPECIAL DE ANISTIA REPARA FAMÍLIA DE BÉRGSON GURJÃO


( texto publicado no Portal Vermelho, no dia 21 de maio de 2009)



A Comissão Especial de Anistia Wanda Sidou aprovou por unanimidade o pedido de reparação solicitado pela a família do ex-guerrilheiro Bérgson Gurjão Farias. O julgamento que aconteceu na manhã desta quinta-feira (21), no auditório da Reitoria da Universidade Federal do Ceará, foi histórico. Desde 2003, quando foi instaurada a comissão, esta foi a primeira sessão onde o julgamento foi realizado fora dos âmbitos da comissão.

Colegas da Universidade, amigos, parlamentares, familiares, comunidade acadêmica. Muitas pessoas estiveram presentes para participar do julgamento público que atendia ao pedido de indenização da família de Bérgson Gurjão de Farias, ex-guerrilheiro cearense morto em combate durante a Guerrilha do Araguaia. O clima que predominava no Auditório da Reitoria da UFC, Universidade em que o cearense estudava, era de emoção e reconhecimento.

Para Mário Albuquerque, presidente da Comissão Especial de Anistia Wanda Sidou, realizar o julgamento de Bérgson dentro da Universidade teve um fator simbólico. “Sabemos que este processo tem um diferencial. Bérgson era muito querido e foi um herói por acreditar e lutar por dias melhores. Esta é uma forma de nos solidarizar com a família”, destacou.

Representante do reitor da UFC, Clarice Ferreira Gomes comentou que a Universidade se sentia honrada por sediar momento tão histórico e de reconhecimento. “Nós reconhecemos a importância de Bérgson dentro do movimento político e estudantil, não só a nível local mas também a nível nacional. Nossa residência universitária feminina recebeu o nome de Bérgson como forma simples de render-lhe justa homenagem”, ratificou.

Contemporâneo de Bérgson, o presidente estadual do PCdoB/CE Carlos Augusto Diógenes, o Patinhas, fez um relato emocionado sobre os momentos de convivência entre os dois e do exemplo que Bérgson era para tantos estudantes naqueles anos de 1964/1968. “Conheci o Bérgson em 1965, entramos no PCdoB na mesma época. No movimento estudantil, vivíamos próximos mas sempre percebia que o Bérgson se destacava tanto pelo porte físico quanto pela forma acessível como se relacionava com todos”, destacou. Com a Ditadura, confirmou Patinhas, os principais líderes estudantis cearenses foram obrigados a sair do Estado. “Desde então nunca mais tive contato com Bérgson. Anos depois soube que ele foi um dos primeiros guerrilheiros a tombar no Araguaia. Eu e minha companheira Noélia fizemos questão de render nossa homenagem ao amigo tão querido e inesquecível”.

Patinhas ressaltou a importância de o julgamento ter acontecido dentro da Universidade. “Considero esta uma reparação simbólica que o aparelho do Ceará cometeu contra os estudantes, em especial contra o Bérgson. Ele amava esta Universidade. Foi aqui nesta avenida que o camarada construiu sua vida dentro do movimento estudantil. Eram nesses quarteirões que aconteciam as articulações políticas daquela época. A vida de Bérgson passava por aqui”, confirmou o dirigente comunista que ressaltou que aquele momento configurava um ato vivo pela democracia que Bérgson tanto lutou. Patinhas finalizou lendo uma mensagem do presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, que se solidarizou com a família do ex-guerrilheiro e parabenizou o trabalho da Comissão na tentativa de reparar os danos contra presos políticos. “Saudamos dona Luiza Gurjão Farias, que, em sua lúcida e respeitável trajetória de 94 anos, esteve maternalmente ao lado de Bérgson e do povo brasileiro em sua saga pela edificação de uma civilização cada vez melhor, mais justa e mais humana. Saudamos, também, Tânia, Ielnia, Gessiner – irmãs e irmão de Bérgson Gurjão. Bérgson tombou de cabeça erguida contra o arbítrio, em combate, nas selvas do Araguaia, honrando sua determinação de descerrar vitoriosamente o manto das trevas que se deitava sobre o Brasil”, disse Renato Rabelo.

A comissão aprovou por unanimidade o parecer do relator do processo de Bérgson Gurjão, Urico Gadelha, representante do Conselho Regional de Medicina na Comissão. Gadelha requereu o valor máximo da indenização, 30 mil reais. “Este valor é irrisório frente a tanto sofrimento encarado pela família. Seria impossível quantificá-lo. Esta é apenas uma forma de reconhecimento e um pedido público e formal de desculpas que o Estado faz”, destacou Mário Albuquerque, presidente da comissão especial. O deputado Lula Morais, Conselheiro da Comissão como representante da Assembléia Legislativa, referiu-se a Bérgson como “um jovem que dedicou sua consciência a luta pela liberdade”.

Homenagem dos companheiros

Momentos de muita emoção aconteceram quando ex-companheiros de Bérgson lembraram a sua trajetória. A Profª Helena Lutéscia, do Departamento de Farmácia da UFC, destacou o compromisso dele com a UFC. Segundo ela, fazia parte da ética dos líderes estudantis daquela época “serem muito bons alunos”. A ex-prefeita Maria Luiza Fontenele, disse que a UFC, “ao abrigar o julgamento, estava resgatando uma dívida com Bérgson e outros que tombaram na Ditadura”.

O professor e sociólogo Pedro Albuquerque destacou que além das homenagens a Gurjão é preciso dar prosseguimento à luta pela identificação dos corpos das vítimas do regime militar. Para o jornalista Messias Pontes, Bérgson foi “um dos maiores heróis do povo brasileiro, em defesa da Pátria, da liberdade e dos companheiros. Deve servir de espelho à juventude”. Ao receber o carinho dos colegas da época do movimento estudantil, Tânia Gurjão de Farias, irmã de Bérgson, agradeceu emocionada e reforçou. “Apesar de não conhecer muitos de vocês, todos fazem parte da minha família”.

A Comissão Especial também julgou e aprovou por unanimidade o processo de Paulo Emílio Andrade de Aguiar, ex-estudante de Direito e contemporâneo de Bergson, que ao falar relembrou também seu convívio com o líder estudantil comunista.

Sobre a Comissão Especial de Anistia Wanda Sidou

A comissão, que foi instituída em 2003 no Governo Lúcio Alcântara, tinha a função de analisar os requerimentos de indenizações de pessoas que foram perseguidas durante a Ditadura Militar. Os conselheiros que participam da comissão exercem função voluntária, não remunerada.

Íntegra da mensagem de Renato Rabelo (Presidente Nacional do PCdoB)

Aos membros da Comissão Especial de Anistia Wanda Sidou:

Em nome do Partido Comunista do Brasil manifesto a nossa satisfação pelo excelente trabalho que esta Comissão de Anistia vem realizando, visando fazer justiça com aqueles que contribuíram para a reconquista da democracia em nosso País. O julgamento de hoje se inscreve, pelo seu simbolismo, entre as ocasiões históricas nas quais ocorre o reconhecimento dos heróis do povo brasileiro.

Sabemos que a força e a energia da sua generosidade e do seu espontâneo e despojado sacrifício, faz de Bérgson Gurjão Farias e de toda uma legião de homens que se sacrificaram na luta contra a ditadura, os efetivos construtores da democracia que alcançamos. O PCdoB se curva ao seu exemplo de patriotismo e confiança em nosso povo, na condição de seus melhores e mais valorosos filhos.

E tudo começa e tem sua reta de chegada justamente neste cenário em que estamos, no campus da Universidade Federal do Ceará, de onde Bérgson empreendeu seus primeiros passos na política; de onde, projetando-se da sua condição de estimada liderança estudantil, e impedido de viver nas cidades, deu um salto para se tornar um querido guerrilheiro do Araguaia.

É aqui, no auditório da Reitoria da Universidade Federal do Ceará, que a Comissão Especial de Anistia Wanda Sidou julga o pedido de indenização para a família do destacado estudante e combatente Bérgson Gurjão de Farias.

É também aqui que reiteramos nossa disposição, de compartilhar solidariamente dos esforços voltados para a identificação dos seus restos mortais a partir dos indícios que podem localizá-lo, seja onde for, para que possam ser dignamente enterrados.

Saudamos dona Luiza Gurjão de Farias, que, em sua lúcida e respeitável trajetória de 94 anos, esteve maternalmente ao lado de Bérgson e do povo brasileiro em sua saga pela edificação de uma civilização cada vez melhor, mais justa e mais humana. Saudamos, também, Tânia, Ielnia, Gessiner – irmãs e irmão de Bérgson Gurjão.

Bérgson tombou de cabeça erguida contra o arbítrio, em combate, nas selvas do Araguaia, honrando sua determinação de descerrar vitoriosamente o manto das trevas que se deitava sobre o Brasil.

É a nossa mensagem a esta sessão histórica da Comissão de Anistia Wanda Sidou.

São Paulo, 21 de maio de 2009

Renato Rabelo
Presidente do Partido Comunista do Brasil.


Mais sobre Bérgson Gurjão

Bérgson era estudante de Química na Universidade Federal do Ceará (UFC), vice-presidente do DCE eleito em 1968. Foi preso no Congresso da UNE em Ibiúna e, em 1968, excluído da universidade com base no Decreto-lei 477.

Em 1968, no Ceará, foi gravemente ferido na cabeça quando participava de manifestação estudantil na Praça José de Alencar. Em 1969, foi residir na região de Caianos, onde continuou suas atividades políticas. Em 08 de maio de 1972, foi ferido e morto em combate nas selvas do Araguaia.

Na Secretaria Especial de Direitos Humanos, em Brasília, existem restos mortais de possíveis guerrilheiros do Araguaia, havendo indícios de um deles ser do cearense Bérgson Gurjão.

De Fortaleza,
Carolina Campos (com informações da UFC).

2 comentários:

  1. Fiquei emocionada ao ler este texto. Eu fui vítima direta pois meu pai foi preso e cassado. Passei fome e imensa humilhação na escola pública da Ditadura. Mas nem sei se tenho direito a reparação por danos materiais e morais.

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  2. ..emocionante o texto,fui vitima da ditadura tambem,fugi para SP,presenciei as torturas do meu pai,foi 10 anos preso politico,hoje tenho uma irmã que aos 7 anos tem problemas de cabeça devido ha cacetetes que levou dos militares.

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